O best-seller sobre a Guerra Civil de Margaret Mitchell foi agarrado pelo megalomaniaco produtor David O. Selznick, que resistiu à sugestão de escalat Basil Rathbone como Rhett Butler em favor da única escolha que os fãs aceitariam: Clark Gable. Depois de caçar talentos no país inteiro e de uma briga de foice em Hollywood envolvendo cada protagonista feminina em potencial, Selznick contratou a inglesa Vivian Leigh para interpretrar Scarlett O'Hara. Insistindo em que cada detalhe fosse suntuoso, Selznick usou pelo menos três diretores ( Sam Wood, George Cukor e Victor Fleming ), botou fogo nos cenários que haviam sobrado de King Kong para encenar o incêndio em Atlanta, contratou figurantes suficientes para reencenar a Guerra Civil, e aguardou o Oscar para ser aclamado.
Para a história que se propunha a contar, foi o filme certo na hora certa. Scarlett não é uma personagem de 1860, mas de 1930: uma mulher moderna, obstinada e de espírito livre. O caminho dela foi aberto pelas garotas petulantes da era do jazz de Fitzgerald, pelas arrojadas atrizes daquele período e pela dura realidade da depressão, que pela primeira vez levou milhares de mulheres a trabalhar fora de casa. A lascívia de Scarlett tem muito pouco em comum com o mito das delicadas flores sulistas, e tudo a ver com os símbolos sexuais dos filmes que forjaram sua criadora, Margaret Mitchell: estrelas como Clara Bow, Jean Harlow, Louise Brooks e Mae West.
O que move a trama é o coração de Scarlett, que Leigh interpreta como frívola e depois como empedernida: ela é tão apaixonada pelo galante Ashley Wilkins ( Leslie Howard ) que se casa com vários bobalões medíocres ( e malfadados) quando ele escolhe ficar com a mais feminina ( e malfadada ) Melanie ( Olivia de Havilland ). Rhett Butler, mais pragmático do que idealista, entra em cena e ela se sente atraída por ele quando a guerra destrói o estilo de vida sulista. Os dois se casam depois de Scarlett ter jurado nunca mais passar fome em Tara, a fazenda de seu pai, funcionando apesar dos estragos da guerra. Ela só percebe que ama Rhett de verdadequando ele a rejeita, gerando o clássico final em aberto em que o personagem de Gable vai embora (" ("Francamente, querida, eu não ligo nem um pouco "), e ela jura conquistá-lo de volta (" Amanhã é um novo dia ").
Como em O nascimento de uma nação ( 1915 ), E o vento levou maquia boa parte de uma história complexa, mostrando apenas os escravos felizes e obedientes e retratando o envolvimento de Ashley em uma organização nos moldes da Ku Klux klan durante o pós-guerra como algo genuinamente heróico. O filme deixa de lado que as plantações nas fazendas foi conseguido com o suor do trabalho escravo ( há mais simpatia pelos calos nas pequenas e delicadas mãos de Scarlett do que por todos os crimes da escravidão ). Mas os mais importantes papéis de afro-americanos foram apresentados com grande humanismo e complexidade. Hattie McDaniel, como Mammy, é a mais sensível e clarividente personagem na história inteira ( ela ganhou um dos oito Oscars do filme ), muito embora Butterfly McQueen, como Prissy - para sempre associada com a frase "Não sei nada sobre partos" -, seja uma personagem sedutora e insidiosamente subversiva.
Contudo, o rítmo do filme é quase irresistível e as sequências de Selznick estão entre as mais emblemáticas da história do cinema: o zoom-out a partir de Scarlett enquanto ela cuida dos feridos, enchendo de cinza a tela com soldados mutilados; a câmera que corre por entre as chamas enquanto Atlanta pega fogo e muitas outras. Adornado com o exuberante Technicolor de 1939 - os vestidos em tom pastel e as paixões em vermelho vivo - e com a retumbante trilha de Max Steiner, este filme ainda pode ser considerado, com justiça, a última palavra em termos de cinema hollywoodiano.
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