sexta-feira, 9 de março de 2012

O ATALANTE ( 1934 ) - L'ATALANTE


Para viver feliz para sempre com quem você ama, você tem que ter a capacidade de conviver com ele, ou com ela, suportando tudo. Pequenos problemas precisam ser ultrapassados. Ela não gosta de gatos sobre a mesa quando está comendo. Ele guarda sua roupa sujo no armário há mais de um ano. Ela guarda para si os momentos que passam juntos. Ele curte seu melhor amigo, barbudo e tagarela, que chega durante as refeições de camiseta. Ela quer ver Paris. Ele se preocupa com o trabalho. Vejam bem como é.


O Atalante, de 1934, de Jean Vigo, nos conta uma história de amor deste tipo, e consta em muitas listas de grandes filmes - uma honraria que obscurece seu realismo, e a forma direta desta história sobre um casamento com um começo vacilante. O diretor francês François Truffaut se apaixonou pelo filme num sábado à tarde, em 1946, quando tinha 14 anos de idade : "Quando entrei no cinema, nem mesmo sabia quem era Jean Vigo. Fiquei imediatamente dominado por um entusiasmo selvagem pela sua obra". Ouvindo um crítico atacar um outro filme "porque fedia como pés sujos", Truffaut o considerou como um cumprimento, e pensou em Vigo e na pungente vida que ele evocava numa barcaça francesa.


Em linhas gerais, O Atalante parece uma história comum. Começa com o casamento de Jean, um jovem capitão de uma barcaça, com Juliette, uma jovem de um vilarejo. Não há festa de casamento. Ainda com o vestido de noiva, ela sobe na barcaça, para começar a vida não somente com seu marido, mas também com o maciço e claudicante amigo dele, Jules, um marinheiro que passara por Yokohama e Singapura, mas que atualmente navegava nas águas entre Le Havre e Paris. a barcaça ainda tinha um taifeiro a bordo e pelo menos seis gatos.


Juliette faz o melhor que pode nesta situação. Quando uma gata dá à luz na cama dela, rasga o lençol sem levar em consideração as objeções de Jules, que não encontra qualquer motivo para tantos melindres. Certa noite ouve pelo rádio as mágicas palavras "Isto é Paris". Ela nunca estivera em Paris, ou em qualquer outro lugar. Quando a barcaça chega a cidade, Jean pede a mulher que se arrume para passar a noite ali - mas Jules sai em busca de aventuras carnais e eles então têm que ficar a bordo. Finalmente, ela sai sozinha para a cidade, planejando voltar antes que o marido sinta a sua falta. Jean percebe e, irado, resolve ir embora. A barcaça não está mais ali quando Juliette volta...


Juliette é interpretada por Dita Parlo, uma lendária atriz nascida em Berlim, que fez vinte e cinco filmes entre 1928 e 1940, e mais um em 1950 e outro em 1965. O livro Sex, de Madonna , se inspirou, diria a cantora, na Parlo de O Atalante. Michel Simon, que ainda não tinha 40 anos quando o filme foi rodado, interpreta Jules, parecendo ter 60 anos, forjado pelo ar salino e com marcas dos cabarés da beira do cais. Inspirado pela visão dos dois jovens se beijando, ele tem o seu melhor momento quando demonstra que sabe lutar - e luta consigo mesmo sobre o convés, enquanto Vigo o funde com dois desolados fantasmas lutando pela posse do mesmo corpo. Jean Dasté, que faz o papel de Jean, transmite o desamparo de um jovem homem que sabe que está amando, mas que não sabe nada a respeito de relacionamentos - como ele deve tratar Juliette e intuir o que poderia magoá-la. Embora o filme termine com todo mundo feliz e de volta a bordo, duvidamos que tenhamos visto a última briga deles.


A morte de Vigo aos 29 anos foi uma perda trágica. O Atalante, no entanto, coroa seu legado. E não existe no cinema cena tão sexy quanto a montagem magnífica dos corpos de Jean e Juliette, distantes um do outro, iguais em sua postura de excitação mútua, em um ato de amor possível somente através da linguagem vibrante dos filmes.



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