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quinta-feira, 15 de novembro de 2012

A FELICIDADE NÃO SE COMPRA (1946) - IT'S A WONDERFUL LIFE


Na véspera de Natal, o caridoso George Bailey (o astro James Stewart, de Janela Indiscreta) decide se suicidar por não ter como pagar uma dívida inesperada. Ele é salvo por seu anjo da guarda, que lhe mostra como sua cidade seria diferente se ele não tivesse nascido.


A melhor coisa que podia ter acontecido com A felicidade não se compra, é que ele caiu fora da proteção dos direitos autorais, dentro do obscuro terreno da terra de ninguém do domínio público. Em razão disso, qualquer estação de televisão que obtivesse uma cópia poderia levá-la ao ar, sem custo, tantas vezes quanto quisesse. E isto acabou proporcionando a redescoberta do esquecido filme do diretor Frank Capra e transformando-o em uma tradição do Natal.


Os canais de televisão não comerciais e educativos foram os primeiros a entrar nesta onda, nos primórdios dos anos 70, utilizando a saga do herói da pequena cidade, George Bailey, como uma antiprogramação contra os caros programas das redes durante os feriados. Para a surpresa dos diretores de programas das emissoras, a audiência do filme cresceu a cada ano que passou, e muitas famílias fizeram disso um ritual anual.


O que é mais notável sobre A felicidade não se compra é como ele se mantém há tantos anos; é um desses filmes que não envelhecem e que só melhoram com o tempo. Alguns filmes, mesmo bons, foram feitos para ver somente uma vez. Quando tomamos conhecimento de como terminam, perdem seu mistério e apelo. Outros filmes podem ser vistos por um indefinido número de vezes. Como uma grande música, crescem com a familiaridade. A felicidade não se compra se incluí na segunda categoria. Tanto Capra, o seu diretor, quanto James Stewart, o seu astro, o consideram como seu filme favorito.


Frank Capra nunca pretendeu que A felicidade não se compra fosse classificado como um "filme de natal". Este foi o primeiro filme que realizou após dar baixa no serviço militar na Segunda Guerra Mundial, e por isso queria fazer algo especial - uma celebração das vidas e dos sonhos dos cidadãos comuns da América, que tentavam da melhor forma possível fazer as coisas certas, para si e para seus vizinhos. Depois de se transformar no poeta dos homens comuns de Hollywood na década de 30, com uma série de fábulas populistas (Aconteceu naquela noite, O galante Mr. Deeds, A mulher faz o homem, Do mundo nada se leva), Capra encontrou a idéia para A felicidade não se compra numa história de Philip Van Doren Stern, que estava juntando poeira nas prateleiras do estúdio.


Para Stewart, que também mal acabara de voltar da Segunda Guerra, o filme era sua chance de voltar a trabalhar com Capra, após A mulher faz o homem. O filme, para os padrões de Capra, era sombrio e não convencional, substituindo o otimismo dos seus trabalhos pré-guerra com observações de que as coisas às vezes terminam mal. É um truísmo que os trailers de Hollywood não mostrem o filme como ele é, mas o filme que o estúdio gostaria que fosse feito. O trailer de A felicidade não se compra destaca o ângulo amoroso entre Stewart e Donna Reed, negligencia a mensagem e evita a melancolia - mas o filme não foi um sucesso de bilheteria, e foi esquecido até cair no domínio público e suas cópias começarem a rodar pelo mundo.


Os últimos acontecimentos do filme têm uma força fundamental, quando o bêbado George Bailey cambaleia por uma cidade que gostaria de odiar e que mais tarde visita de novo pelas mãos de seu peculiar anjo da guarda. Stewart revela então um lado que os cinéfilos veriam novamente em filmes como Um corpo que cai, de 1958, de Hitchcock, e o wester de Anthony Mann O preço de um homem, de 1953. Se ele era, como escreveu Andrew Sarris, "o mais completo ator-personalidade do cinema americano", este foi o filme que representou sua virada em busca da perfeição, revelando um lado escuro que fora quase impossível de perceber antes da guerra. O alegre e desengonçado condutor de comédias de antes da guerra, como Núpcias de escândalo e A loja da esquina (ambos de 1940), agora não fazia a barba, era amargo, andava de bar em bar e contemplava o suicídio.


Stewart continuou a representar nos anos seguintes, abandonando o seu otimismo pré-guerra, para interpretar assassinos e caçadores de animais nocivos, obcecados sexuais e moralmente falidos. Este foi um movimento perspicaz em sua carreira, que lhe deu fôlego e ligou-o a diretores - especialmente Hitchcock, Mann e John Ford - que estavam entre os mais criativos em disponibilidade. 


A abordagem de capra, aqui como em todo o lugar, é depender da parábola subjacente para prover o âmbito do filme. Nós podemos divisar, mesmo nos momentos mais tristes, que estamos numa jornada de esperança. Capra não era um cineasta complexo, e uma das razões para seu declínio pós-guerra talvez se deva à sua dificuldade em se ajustar à forma como a guerra abalou os princípios fundamentais do otimismo norte-americano. Em A felicidade não se compra, de toda forma, a tensão entre o lado escuro de Stewart e as esperanças de Capra é que dá vida ao filme. 


A felicidade não se compra pouco representa na carreira pós-guerra de Capra, que com certeza nunca mais recuperou o mágico sucesso que teve nos anos 30. Filmes mais contemporâneo, como Sua esposa e o mundo, de 1948, e Dama por um dia, de 1961, têm o toque de Capra, mas não a sua magia, e o diretor não produziu mais qualquer filme após 1961. Mas continuou sendo uma figura pública ativa e um cidadão de Hollywood até que um ataque cardíaco , no final dos anos 80, o deixou inativo; morreu em 1991. Numa oficina de filmes com estudantes nos anos 70, ele foi questionado sobre se ainda existia um caminho para fazer filmes sobre os tipos de valores e ideais que impregnavam os dele. "Bem, se não houver", respondeu ele, "nós devemos desistir de tudo."







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